quarta-feira, 14 de julho de 2010

Um copo de arrependimento, por favor

Sempre sonhei em ter tudo de mais glamuroso que poderia existir. Uma enorme casa, fama, belíssimas roupas, dinheiro, muito dinheiro. Era ainda 2003 e eu já invejava minhas colegas da quinta série, por terem roupas bonitas, sapatos sempre da última moda, cabelos macios como pêssego. Naquela época, meus pais estavam investindo em uma sociedade com uma empresa que hoje, é muito conhecida. Nós ainda morávamos em um bairro muito simples de Porto Alegre, em uma pequena casa lilás rodeada por uma meiga cerca branca. Apesar da nossa simplicidade, sempre estávamos cercados de amigos. Amigos que nunca mais tivemos...
Foi naquele pequeno bairro que vivenciei todos os momentos mais felizes da minha vida. E os mais importantes também. Inesquecíveis. Ofegantes. Era por volta das cinco horas de uma tarde fresca de Novembro quando aquilo aconteceu. Eu, Emanuel, Eduarda e Anna brincávamos de esconde-esconde como de costume na pequena praça já bastante danificada quando o que eu nunca imaginava até então ocorreu. Eu estava escondida atrás do pequeno muro da praça quando Emanuel apareceu, e lentamente encostou seus lábios nos meus. O beijo mais incrível e indescritível da minha vida. Emanuel, o garoto mais palhaço e idiota que alguém poderia conhecer, me beijando. Sim, e foram mais vezes, semanas, até chegar o dia da minha despedida. Sinto um enorme aperto no peito quando eu lembro que eu poderia ter feito algo para impedir que tirassem a minha felicidade, arrancassem ela de mim. Mas não, eu ainda tinha aquela mania de riqueza na cabeça, e eu não podia perder aquela oportunidade.
Foi tudo tão rápido. A mudança. Malas. Viagem. Dinheiro. Mansão. Tanta magia me cegou que não tive a capacidade e a coragem de dizer adeus para meus amigos e principalmente, para Emanuel. Parti sem dar explicação alguma. Foi como eu tivesse se desmaterializado, se dissolvido no ar. Meu pai, o Sr. Walter, havia conseguido se firmar na sociedade da empresa e ganhou muitos benefícios. E principalmente, aquilo que as pessoas mais querem: o dinheiro. Era necessário que fizéssemos uma mudança rápida até São Paulo, para facilitar o contato com a empresa. Enfim, mamãe Meg disse que iríamos para uma mansão, como aquela que eu sempre sonhava, onde também, teríamos tanto dinheiro que poderíamos ir ao shopping todos o dias e por isso, eu não deveria ficar triste. É claro que eu não iria ficar triste, era tudo o que eu sempre sonhei e nada e nem ninguém iria impedir que realizassem meu sonho. Nem Emanuel.
No começo, tudo era tão mágico, o que eu sempre imaginei estava se realizando. Todos os dias, à tarde, eu e mamãe íamos ao shopping, tomar aquele saboroso sorvete de chocolate e fazer compras. Como aquelas roupas eram magníficas. Porém, a ilusão um dia deve terminar. Mamãe também começou ir trabalhar à tarde na empresa e agora, todos os dias, fico em frente de um notebook conversando com amigos que nem conheço, e que não me fazem sorrir como meus antigos amigos faziam. Ah, Emanuel. Nem amigos na escola tenho, digo, amigos que realmente se importam comigo, com a minha felicidade. Mas é tempo de tornar àquela tarde de novembro, uma tarde clara e fresca, sossegada como a nossa casa e o trecho da rua em que morávamos. E é isso mesmo que irei fazer, eu preciso fazer alguma coisa, encontrar Emanuel, aonde quer que ele esteja, pedir desculpas pela minha insensatez e recuperar o tempo que perdi com a magia do dinheiro. Estúpido dinheiro.

Continua.
Beijo, luci.

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